Longe de um comparativo de importâncias, mas se Gutemberg fez uma revolução no mundo da informação e do conhecimento motivando a Reforma protestante de Lutero, o iluminismo, as panfletagens que desencadeou a Revolução Russa (destacando alguns dos maiores eventos) hoje, os créditos das próximas revoluções nos livros de História – em questão de invenção e disseminação de ideais – poderia ser creditado a Bill Gates (e sua “r-evolução” na informática) ou, ao criador do Facebook® Mark Elliot Zuckerberg? A informática entra definitivamente na História. Marco principal, Julian Assange: criador do WikiLeaks (site que divulgou documentos confidenciais do governo dos Estados Unidos), que teve forte repercussão mundial chegando a ser indicado ao Prêmio Nobel da Paz em 2011, pelo parlamentar norueguês Snorre Valen que disse "uma das contribuições mais importantes para a liberdade de expressão e transparência" neste século "ao divulgar informações sobre corrupção, violações dos direitos humanos e crimes de guerra, o WikiLeaks é um candidato natural ao Prêmio Nobel da Paz". Recentemente outro nome registrou presença inquestionável na História, Edward Snowden: que denunciou um enorme esquema de espionagem mundial dos EUA e que, certamente ditará novas relações internacionais, suscitará novas reflexões a respeito de soberania e fronteiras territoriais, talvez até já tenha deflagrado o “início” de uma longa e silenciosa guerra cibernética.
E o Brasil nisso tudo? Entrou no circuito das manifestações populares motivadas por redes sociais, como aconteceu no que foi chamada de Primavera Árabe (em 30/06: 17 milhões de manifestantes egípcios nas ruas) e, o que já se anteciparam – num puro imediatismo – a chamar de “Primavera Tropical” o nosso 17 de junho. Esta data, para muitos foi uma manifestação da classe média, mas o que levou a classificarem assim? Será que disseram isso por esta ter sido motivada pela internet? Será que pelo fato das duas frases de maior significação das passeatas caracterizarem um perfil consumista: (“O gigante acordou” – alusão ao comercial vigente do whisky Johnnie Walker e; “Vem pra rua” – slogan de um comercial recente da Fiat)? Será que por não aceitarem nenhuma legenda de partidos políticos? Será que por ter sido um estudante de “Arquitetura” que depredou a Prefeitura de São Paulo? Ou, por não aceitarem a equipe da Rede Globo nas manifestações?
Na História brasileira a classe média vem à tona na famosa passeata de 19 de março de 1964 conhecida como “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, com uma liderança religiosa e um intuito anti-comunista, motivadas pelas medidas de nacionalização e reforma agrária anunciada por João Goulart, somada a uma desordem econômica e um panorama político confuso (nestes dois últimos quesitos, qualquer semelhança é mera coincidência), como consequência: um recrudescimento da repressão. No 17 de junho, entretanto, as manifestações em nível nacional nitidamente não tinha um objetivo definido (o valor das passagens foi só um estopim) e nem uma liderança reconhecida. O que ficou claro em 1964 é que aquele movimento popular poderia facilmente ser classificado como de “direita” e a quem diga que o nosso 17 de junho também. Segundo alguns esquerdistas, motivo suficiente para isso estaria nas frases de alguns cartazes presentes como “Ame-o ou deixe-o” e “verás que o filho teu não foge à luta”; que o repúdio as siglas partidárias seriam uma atitude fascista, porém, mais que isso a meu ver (se me prestasse a analisar sob esse ângulo), seria as ausências de pautas sempre constantes em todas as grandes manifestações como, por exemplo: pedidos de reforma agrária e protesto direto a determinada personalidade do governo (duas coisas que a Esquerda jamais afirmaria nos dias de hoje – já que estão no poder e, uma vez sem voz nas manifestações, estas então, só poderia ter sido motivada pela oposição, ou no meio de tantas alianças, pela extrema “oposição” [fascistas]).
A presença da Esquerda à frente das manifestações brasileiras sempre foi o carro-chefe das reivindicações do povo. Nos últimos tempos foram personagens principais nas “Diretas Já” em 1984, no Impeachment de Collor em “1992”, na “Marcha dos 100 mil em Brasília em 1999” (contra as políticas de FHC), mas, no 17 de junho não estiveram presentes (?). Como que, com toda uma historia de luta, as bandeiras vermelhas não foram hasteadas em junho? Seria por suas constantes fragmentações (PT, PSTU, PCO, PSOL) que causou certo descrédito e um número reduzido de militantes “desunidos”? Fato é que as forças partidárias ainda estavam – como sempre - atrasadas com o modelo antigo de informação de Gutemberg em pleno século XXI (com panfletos e cartazes) e, não se atualizaram, não perceberam a força da internet com seus posts, páginas, hashtags, facebook, twiter, etc. coisa que o mercado, o “capitalismo”, há muito tempo faz uso. Terem negado a presença de legendas partidárias não foi algo premeditado – a verdade é que perceberam as manifestações tarde demais e, correram para levantar suas bandeiras (como alguém que chega tarde à festa e quer ser o primeiro a comer o bolo).
As grandes forças sindicais perplexas por não só não terem sido elas a força motriz destas manifestações, mas ainda de não poderem marcar presença nelas: procuraram de todas as formas organizar-se rapidamente. Cientes das hostilidades nas passeatas de junho, eles anunciaram uma diferenciação – para não falar “distanciamento” –, daqueles que a mídia tentou destacar como organizadores do 17 de junho. Para isso precisaram ser mais específicos declarando ousadamente o “Dia Nacional de Luta, com mobilizações, paralisações e greves”: evidentemente um protesto da classe trabalhadora. No dia 11de julho, reuniram 10 mil na Avenida Paulista (com denúncias de que houve pagamentos para pessoas fazerem número no local), 100 mil somados todos os protestos no país – irrisório em vista do que é a classe trabalhadora no país e para o título de “greve geral” como anunciado. Ficou claro que não querem perder seu lugar, ou melhor, sua imagem “simbólica” na sociedade – um passo em falso para o momento. É de conhecimento de todos que os sindicatos são caracteristicamente partidários e, sendo assim, tão desacreditados quanto todas as legendas atualmente; entretanto têm muita força e, uma prova do poder dos Sindicatos foi uma pequena amostra dada por um grupo dissidente dos sindicatos dos transportes de São Paulo: um dia antes da greve geral, fecharam 15 terminais de ônibus prejudicando 750 mil pessoas, sem a ajuda ou apoio de um único trabalhador!
Na História do Brasil todas suas grandes manifestações sempre culminaram em um resultado positivo (1984, 1992) ou negativo (1964, 1968). Ora, pode-se dizer que tivemos conquistas com o nosso 17 de junho? Certamente mas, a estrutura política engessa qualquer mudança significativa. Prova disso, foram as propostas impensadas feitas por Dilma Roussef num claro sinal de desespero e, que repercutem até hoje como o plebiscito e contratação de médicos estrangeiros esta acabou despertando greves até hoje na categoria – agravando ainda mais a relação governo e povo. Poderia também em contrapeso citar que, o caso do uso dos aviões da FAB, num momento crítico da nossa política, por Joaquim Barbosa, Renan Calheiros e outros, foram uma prova de que eles não se incomodaram tanto com a indignação brasileira mas, vejo que este ato não foi por mal, longe disso, foi uma clara demonstração do quanto o uso do bem público está arraigado no inconsciente coletivo dos nossos governantes.
O que percebi é que todos estão acostumados a fazer uma leitura das manifestações da mesma forma como sempre se fez no passado e esta não é uma manifestação igual as anteriores, igual as que aconteceram anteriores a ela: ela é nova como tentei demonstrar aqui. No passado, elas sempre foram motivadas por um objetivo em especial, por uma exigência de substituição do poder vigente, por um estímulo de alguma instituição seja ela político, religiosa ou de classe; onde os interesses populares sempre estiveram em um segundo plano “à emergir”. Entretanto, por mais que tentem enriquecer o que foi o 17 de junho com os motivos políticos mais fundamentados possíveis, com o brilho mais reluzente para à História, com a ideia do primeiro passo para um grande povo “que acordou”, a realidade é que é muito, muito cedo para podermos caracterizar um povo. Que é um sinal, isso é indiscutível e, um sinal nunca visto antes em nenhum lugar do mundo? Sim! Que ninguém sabe ainda como tratar e refletir isso também é um fato. Evidentemente o que ficou manifesto e, ao mesmo tempo, chocante é uma clara manifestação de repúdio a instituição “democrática” vigente e, uma áurea de incerteza presente. Outra grande manifestação está sendo marcada para 07/09, agora não mais pela MPL, mas, pelo Anonymous Brasil (emergindo das sombras), agora não mais pelas passagens mas por algo mais concreto, complexo e menos evidente. Terá a mesma repercussão apesar de estarem fazendo uso dos mesmos meios (redes sociais)? Caso seja tão grandiosa ou maior que nosso 17 de junho, o que os políticos farão dentro de uma instituição altamente burocratizada, dividida em milhares de conflitos de interesses pessoais e partidários, ruindo em escândalos políticos? Dizer que “só o tempo dirá”, seria muito clichê, talvez quem sabe, poderia ser “só os políticos dirão” ou “só o povo dirá” ou, como demonstra a nossa História nesses períodos de incerteza econômica e política: “só os militares dirão”.